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Vigília de apoiadores usada para deter Bolsonaro gera alerta sobre liberdade religiosa, dizem juristas

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Brasília – A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de decretar a prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro tomou como um dos fundamentos a vigília organizada por simpatizantes em frente à residência do ex-chefe do Executivo. O despacho, assinado na terça-feira (25), classificou o encontro como “reunião ilícita” que colocaria “em risco a ordem pública e a efetividade da lei penal”.

Ao questionar a intenção dos participantes e associar o ato religioso a potencial tumulto, Moraes abriu um precedente que, na avaliação de especialistas em direito religioso, pode impactar a liberdade de culto em todo o país. André Fagundes, professor de Direito Religioso e mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Coimbra, afirma que a interpretação cria margem para que juízes de primeira instância passem a presumir ilicitude em orações públicas realizadas diante de hospitais, escolas ou residências de autoridades. “Se essa lógica se espalhar, a liberdade religiosa e a liberdade de reunião pacífica viram apenas promessa abstrata”, destacou.

Warton Hertz, advogado e diretor técnico do Instituto Brasileiro de Direito e Religião (IBDR), observa que a decisão partiu de um tribunal superior e tende a orientar julgamentos futuros. Para ele, alegações genéricas de ameaça à ordem pública podem ganhar conotação ideológica e resultar em novas restrições a manifestações de fé.

Exemplos internacionais

Casos semelhantes já foram registrados na Europa. Desde 31 de outubro de 2024, Inglaterra e País de Gales proíbem qualquer ação pró-vida num raio de 150 metros de clínicas de aborto, com pena de até seis meses de prisão e multa. Há ocorrências de detenções de cidadãos que rezavam em silêncio nesses locais. Em dezembro de 2022, a britânica Isabel Vaughan-Spruce foi algemada em Birmingham após admitir que poderia estar orando mentalmente.

Na Alemanha, um tribunal municipal vetou em 2021 vigílias e noites de oração silenciosa diante de clínicas de aborto, considerando-as constrangedoras para quem buscava o procedimento.

“Crime de pensamento”

Juristas apontam que a análise da “intenção subjetiva” dos fiéis aproxima-se da ideia de punição por pensamento. “Identifica-se um grupo moralmente inconveniente, transforma-se o incômodo subjetivo em perigo objetivo e criminaliza-se o gesto”, resume Fagundes.

Para Hertz, a experiência europeia sinaliza possível trajetória brasileira: “As tendências são rapidamente copiadas e normalizam decisões antes consideradas absurdas. Agora, não é só a livre manifestação de pensamento que está em jogo, mas o livre pensamento em si”.

Fagundes acrescenta que a criminalização de vigílias decorre de “visão materialista” que enxerga qualquer expressão religiosa no espaço público como ruído a ser eliminado. “Quando o Estado decide o que é oração legítima, a religião vira departamento do governo”, conclui.

Com informações de Gazeta do Povo