Imagens registradas entre 7 e 9 de novembro, durante o fim de semana do Grande Prêmio Brasil de Fórmula 1, mostram viaturas da Polícia Civil e da Guarda Civil Metropolitana (GCM) escoltando diversos automóveis sem placa entre um hotel na zona sul de São Paulo e o autódromo de Interlagos. Os comboios avançaram sinalizações de trânsito e contaram, em alguns momentos, com escolta pessoal para integrantes da equipe Ferrari.
A gravação, obtida de uma fonte ligada à organização da corrida, exibe «mais de uma dezena» de veículos civis sem identificação oficial acompanhados por carros das forças de segurança. Entre as cenas, o diretor da Ferrari, Frédéric Vasseur, aparece conduzido por dois guardas civis até a área restrita da escuderia dentro do autódromo.
Autoridades negam escolta particular
Procurada, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) afirmou que não foram feitas escoltas privadas, mas sim “patrulhamento preventivo especializado” coordenado pelo Grupo Armado de Repressão a Roubos e Assaltos (Garra) em apoio à Delegacia do Turista (Deatur). Segundo a pasta, o esquema contou com 1,2 mil agentes por dia, 400 viaturas, aeronaves, drones e câmeras de reconhecimento facial.
A Secretaria Municipal de Segurança Urbana, responsável pela GCM, declarou não ver ilegalidade nas ações e citou a Lei Federal 13.022/2014, que permite apoio da guarda em grandes eventos. O órgão não detalhou quem, exatamente, foi considerado “autoridade ou dignitário” para justificar a proteção.
Especialistas apontam falta de respaldo legal
Para o constitucionalista Alessandro Chiarottino, o emprego de agentes públicos em benefício de equipes privadas infringe o princípio da finalidade pública. Ele argumenta que o trânsito de veículos sem placa, mesmo integrando comboios policiais, não encontra amparo na legislação.
O coronel da reserva da PM e advogado Alex Erno Breunig acrescenta que o Código de Trânsito admite prioridades apenas em serviço “efetivo e devidamente autorizado”. “Não há permissão para carros, oficiais ou civis, circularem sem placas”, disse.
Já o jurista André Marsiglia classifica a prática como desvio de finalidade. Caso haja remuneração privada, alerta, o episódio pode configurar peculato-desvio (art. 312 do Código Penal) e improbidade administrativa, com eventual perda de cargo e responsabilização criminal dos envolvidos.
Carros sem placa e suspeita de pagamentos
Analistas observam que a ausência de placas reduz o risco de multas em radares. A Polícia Civil nega qualquer pagamento extra aos agentes. Mesmo assim, especialistas defendem apuração para verificar se houve compensação financeira irregular ou uso indevido de bens públicos.
Em nota, a SSP reforçou que “todas as atividades policiais foram planejadas com foco exclusivo na segurança pública” e que os serviços regulares nas ruas não sofreram prejuízo. A GCM reiterou que a escolta faz parte de um protocolo “adotado há vários anos” em grandes eventos na capital.
Próximos passos
Apesar das justificativas oficiais, juristas sustentam que o transporte de particulares em veículos sem placa, sob escolta policial, carece de previsão legal e deve ser alvo de investigação para esclarecer eventual desvio de recursos ou abuso de poder.
Com informações de Gazeta do Povo