Diversas organizações da sociedade civil voltaram a contestar a forma de atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) e a cobrar mecanismos que contenham o que consideram excessos da Corte. Manifestos divulgados desde agosto reúnem juristas, ordens de advogados e entidades empresariais que pedem restrição a decisões monocráticas, maior transparência e a criação de um código de conduta para os ministros.
Juristas propõem código de conduta
No início de outubro, um grupo ligado à Fundação Fernando Henrique Cardoso apresentou documento sugerindo um código de conduta com regras sobre imparcialidade, conflitos de interesse, manifestações públicas e quarentena pós-mandato. O texto também defende o restabelecimento da colegialidade — exigindo que temas relevantes sejam julgados pelo plenário — e o fim de análises complexas no ambiente virtual.
A proposta contrasta com declaração do ministro Alexandre de Moraes, que, em junho de 2024, disse “não ver necessidade” de nova norma porque a Constituição já orientaria a conduta dos magistrados.
OAB-PR contesta penas do 8 de Janeiro
No fim de agosto, a seccional paranaense da Ordem dos Advogados do Brasil divulgou manifesto sobre os julgamentos dos réus pelos atos de 8 de janeiro de 2023. A entidade apontou penas desproporcionais, uso ampliado de conexões processuais e risco de violação do princípio da individualização da pena. A carta reconhece o papel do STF na defesa da democracia, mas afirma que a legitimidade da Corte depende do rigor no respeito às normas constitucionais.
Setor produtivo fala em desproporção
Federações industriais e comerciais, como Fiesp (SP) e Fiergs (RS), aderiram às críticas. Elas reagiram a decisão de 2022 do ministro Alexandre de Moraes que autorizou operação da Polícia Federal contra empresários por mensagens privadas em que discutiam suposto golpe de Estado. As entidades afirmam que a medida afronta a liberdade de expressão e pedem a divulgação integral dos fundamentos da decisão.
Na região Sul, cerca de 120 associações, entre elas a Câmara de Dirigentes Lojistas de Florianópolis e o Instituto de Estudos Empresariais, publicaram manifesto em defesa do direito à livre opinião. A Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil classificou como “perplexo” o uso de bloqueios bancários sem demonstração de ameaça real à democracia.
Liberdade de expressão em debate
Em junho, o Instituto Sivis criticou entendimento do STF que afastou a literalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, permitindo responsabilizar plataformas por conteúdos de terceiros sem ordem judicial prévia. Segundo a entidade, a decisão viola tratados internacionais assinados pelo Brasil e pode provocar remoções em massa de publicações legítimas.
Preocupação internacional
Relatório da Organização dos Estados Americanos, divulgado no início de 2025, alertou para a anulação de provas da Odebrecht, determinada pelo ministro Dias Toffoli, e apontou risco de insegurança jurídica no combate à corrupção. A Transparência Internacional teme que o país se torne um “cemitério de provas” de subornos internacionais.
Especialistas veem críticas ainda tímidas
Para o constitucionalista André Marsiglia, o movimento da sociedade civil é contido pelo receio de retaliações. Ele afirma que, sem debate público amplo sobre o papel do STF, um código de conduta teria eficácia limitada. Já o professor Alessandro Chiarottino avalia ser improvável que a Corte se submeta a pressões externas, mas prevê crescimento gradual do descontentamento.
O comentarista político Luiz Augusto Módolo ressalta que o empresariado teme ser rotulado e, por isso, evita confrontos mais diretos com o Tribunal. Mesmo assim, ele considera positivo o surgimento de notas que exigem colegialidade e respeito ao devido processo legal.
As manifestações evidenciam um alinhamento incomum entre juristas e setor produtivo, que defendem maior previsibilidade e limites claros à atuação do Supremo.
Com informações de Gazeta do Povo