Brasília — A liminar concedida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino, no domingo (21), suspendeu a revalidação de R$ 1,9 bilhão em emendas parlamentares e reabriu o embate entre Judiciário e Legislativo sobre o controle do Orçamento.
O dispositivo barrado fazia parte de um projeto de lei que reduz benefícios fiscais e amplia a tributação sobre apostas esportivas, fintechs e Juros sobre Capital Próprio (JCP), estimando arrecadação de cerca de R$ 20 bilhões. Incluído sem relação direta com o texto original, o artigo foi classificado como “jabuti”.
A medida autorizava o pagamento, até 2026, de restos a pagar não processados desde 2019, inclusive valores já cancelados, favorecendo principalmente emendas do extinto orçamento secreto e emendas de comissão. Essas emendas de relator (RP 9) foram declaradas inconstitucionais pelo próprio STF por falta de transparência.
O projeto ainda aguarda sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tem prazo até 12 de janeiro de 2026 para vetar ou aprovar integralmente o texto. Mesmo que Lula sancione o dispositivo, os efeitos permanecem suspensos por determinação de Dino.
Governo pediu inclusão do artigo, dizem líderes
Relator da proposta na Câmara, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) afirmou ter atendido a solicitação do Executivo para “não perder espaço orçamentário”. Segundo ele, a Casa Civil elaborou o trecho e enviou ministros para negociar a inclusão.
Após a decisão do STF, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), reuniu-se com Dino para explicar o acordo político que viabilizou a votação. Assessores do parlamentar relataram que os recursos seriam destinados a obras inacabadas de mais de dez ministérios.
No Palácio do Planalto, auxiliares admitem recomendar veto ao dispositivo, apesar da suspensão judicial, para reduzir o desgaste com o Supremo.
Acordo envolveu pauta penal no Senado
A inserção do “jabuti” ocorreu no contexto de uma negociação mais ampla. No Senado, o líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), admitiu ter fechado com a oposição a votação do PL da Dosimetria, que diminui penas para condenados pelos atos de 8 de janeiro, entre eles o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), preso desde novembro.
Nos bastidores, a liberação de emendas foi usada como moeda para aprovar o projeto fiscal na Câmara. O deputado Kim Kataguiri (União-SP) criticou o mecanismo, apelidado de “emenda panetone”, e citou pagamentos de até R$ 5 milhões a aliados.
Conflito recorrente sobre o Orçamento
A suspensão reforça o atrito iniciado em 2022, quando o STF derrubou o orçamento secreto. Parlamentares acusam o tribunal de interferir na prerrogativa constitucional de alocar recursos, enquanto ministros apontam manobras legislativas para manter verbas sem transparência.
Para 2026, o Orçamento reserva mais de R$ 61 bilhões para emendas, sendo R$ 49,9 bilhões obrigatórios (individuais, de bancada e de comissão) e R$ 11,1 bilhões sob gestão dos ministérios.
“Tem emendas que chegam onde nenhuma verba chegou”, defendeu o presidente do Congresso, senador Davi Alcolumbre (União-AP), ao rebater críticas sobre destinação de recursos.
A decisão de Dino mantém a disputa aberta e projeta novo desgaste entre Executivo e Legislativo logo no início do próximo ano.
Com informações de Gazeta do Povo