Uma liminar do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que modificou o rito do impeachment de ministros da Corte, tem divergências em relação à Lei 1.079/1950 e às práticas adotadas pelo Senado Federal. A análise foi divulgada nesta segunda-feira (7 de dezembro de 2025) e destaca cinco pontos de incoerência na decisão proferida na ADPF 1.259, ajuizada pelo partido Solidariedade.
Entenda a liminar
O despacho de Gilmar Mendes:
- restringe a legitimidade para apresentar denúncias, permitindo apenas ao procurador-geral da República (PGR) protocolar pedidos de impeachment;
- aumenta o quórum para que o Senado admita o processo;
- limita as condutas que podem ser analisadas.
O ministro argumentou que as mudanças são necessárias para proteger a independência do Judiciário e evitar “instrumentalização política” do procedimento. No entanto, documentos encaminhados aos autos pelo Senado e pela Advocacia-Geral da União (AGU) indicam que o risco citado é hipotético e que o modelo vigente nunca resultou em afastamento de ministro desde a redemocratização.
Cinco contradições apontadas
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Risco de perseguição política sem precedentes concretos
Gilmar Mendes citou experiências internacionais, como o caso venezuelano, para justificar a restrição. Contudo, o Brasil só registrou um impeachment de ministro do STF, em 1893, e nenhum processo foi sequer aberto desde 1988, pois todos os pedidos foram arquivados na fase preliminar pelo presidente do Senado.
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Filtro duplo ignora controle já exercido pelo Senado
A liminar transfere ao PGR a exclusividade para denunciar, equiparando essa etapa ao papel da Câmara dos Deputados em processos contra o presidente da República. Críticos observam que o Senado já atua como filtro inicial e nunca acatou reclamações infundadas.
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Intervenção preventiva apesar de prática considerada correta
O ministro justificou a medida para evitar futuras interpretações equivocadas da lei, admitindo que o Senado sempre aplicou corretamente o entendimento do STF. A decisão, portanto, altera regras vigentes sem existência de lesão concreta.
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Discussão sobre mérito de votos contrasta com texto legal
Ao determinar que o mérito de decisões judiciais não pode embasar crime de responsabilidade, Gilmar criticou itens 4 e 5 do artigo 39 da Lei 1.079. Esses dispositivos, porém, tratam de condutas funcionais (como desídia) e não de conteúdo de votos, segundo o próprio Senado.
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Supressão da iniciativa popular colide com direito de petição
A exclusividade do PGR extingue a possibilidade de qualquer cidadão provocar o Senado, como prevê o artigo 5º, inciso XXXIV, da Constituição. Historicamente, esses pedidos sempre foram filtrados pela Presidência da Casa Legislativa, sem causar abertura automática de processos.
As modificações de Gilmar Mendes permanecem em vigor até julgamento definitivo do plenário do STF. Não há data marcada para essa análise.
Com informações de Gazeta do Povo