Os Estados Unidos divulgaram, em dezembro de 2025, uma nova Estratégia Nacional de Segurança (ENS) que reposiciona o foco de Washington para a América Latina, em substituição às prioridades tradicionais na Europa e no Oriente Médio. A iniciativa, considerada nos bastidores uma reinvenção da Doutrina Monroe, coloca o Brasil no centro das atenções norte-americanas em temas como crime organizado, narcotráfico, imigração e presença chinesa na região.
Contato direto entre Lula e Trump
Em 2 de dezembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ligou para o presidente Donald Trump oferecendo cooperação no combate ao crime. Durante a conversa, Lula pediu ajuda para deter o empresário Ricardo Magro, descrito pelo petista como “maior devedor do país” e atualmente residente em Miami. “Se ele quer nos ajudar, vamos ajudá-lo parando-o imediatamente”, declarou Lula, segundo relato do Palácio do Planalto.
Paralelamente, Lula manteve um diálogo não divulgado oficialmente com o líder venezuelano Nicolás Maduro sobre o aumento da presença militar norte-americana próxima à Venezuela.
Organizações criminosas e risco de intervenção
Diferentemente de Argentina e Paraguai, o Brasil não classificou o Primeiro Comando da Capital (PCC) nem o Comando Vermelho (CV) como organizações terroristas. Para o coronel da reserva e analista militar Paulo Roberto da Silva Gomes Filho, a decisão pode ter efeito inverso ao pretendido. “Ao colocar a América Latina no foco estratégico, os Estados Unidos se reservam o direito de intervir, inclusive com o uso da força, para conter ameaças como tráfico de drogas, redes de imigração ilegal e terrorismo”, afirmou.
Pressão contra a China
Além do narcotráfico, a ENS prevê monitorar a expansão chinesa em áreas de tecnologia, energia e minerais estratégicos. O Brasil detém 23% das reservas mundiais de terras raras. Segundo Gomes Filho, o documento “rejeita a presença militar ou o controle de infraestrutura crítica por potências extra-hemisféricas”, referência direta a Pequim.
A especialista em finanças Adriana Melo avalia que a estratégia impõe “sole source contracts” — acordos sem concorrência — a favor de empresas americanas como condição para cooperação. “Fechar a porta para a China passa a ser pré-requisito”, resumiu.
Onde o Brasil se encaixa
Para o economista e doutor em relações internacionais Igor Lucena, Washington deve primeiro mirar governos não democráticos, como Venezuela, Nicarágua e Cuba, e buscar aproximação com Brasília para garantir acesso a minerais. Contudo, a relação brasileira com Rússia e Irã pode “diminuir a capacidade de influência do Brasil na região”, disse o especialista, apontando Argentina e Paraguai como atuais preferências dos Estados Unidos.
Tarifas e sanções em negociação
A nova pressão ocorre enquanto Brasília tenta reverter um tarifaço de 50% sobre importações brasileiras e suspender sanções impostas a autoridades. Em novembro, Trump eliminou sobretaxas sobre vários produtos agrícolas, mas 22% das exportações ainda enfrentam barreiras, segundo o vice-presidente Geraldo Alckmin.
Na sexta-feira (12), Washington retirou o ministro Alexandre de Moraes e sua esposa, Viviane Barci, da lista de sanções da Lei Magnitsky, elogiando o projeto de lei que define regras de dosimetria de penas aprovado pela Câmara dos Deputados. Um dia antes, o subsecretário de Estado Christopher Landau já havia sinalizado apoio à medida, que ainda depende do Senado.
Com a América Latina de volta ao epicentro estratégico dos EUA, analistas alertam que a relação bilateral entrará em fase de negociações intensas — e possivelmente tensas — nos próximos meses.
Com informações de Gazeta do Povo