Brasília — A entrada em vigor da Lei 15.270/2025, que volta a cobrar imposto sobre dividendos depois de três décadas, desencadeou uma corrida nas companhias brasileiras para aprovar a distribuição de lucros ainda em 2025. A nova regra fixa alíquota de 10% sobre valores superiores a R$ 50 mil mensais por beneficiário e passa a valer em janeiro de 2026.
Pelo texto sancionado, as empresas que quiserem manter a isenção precisam deliberar, em assembleia, a divisão dos resultados até 31 de dezembro de 2025. O pagamento propriamente dito pode ser feito até 2028.
Contradições legais e riscos operacionais
Especialistas observam pontos de atrito com a Lei das Sociedades Anônimas, que determina quitação dos dividendos em até 60 dias após a aprovação. “A norma cria insegurança jurídica que certamente será discutida em órgãos administrativos e nos tribunais”, afirma o tributarista Eduardo Natal, da Associação Brasileira da Advocacia Tributária (Abat).
Para o advogado Luís Garcia, sócio do Tax Group e do MLD Advogados Associados, o incentivo “artificial e emergencial” força decisões baseadas em projeções incertas. Entre os riscos apontados estão:
- projeção de lucros que podem não se concretizar, gerando descapitalização;
- endividamento para honrar dividendos acima do resultado real;
- comprometimento do fluxo de caixa e redução da capacidade de investimento.
Montante retido e estratégias de pagamento
Levantamento da Abrasca indica que companhias listadas na B3 acumulam US$ 45 bilhões em lucros não distribuídos, dos quais 60% (cerca de US$ 27 bilhões) pertencem a investidores estrangeiros.
Para viabilizar os desembolsos extraordinários, algumas empresas recorrem a:
- emissões primárias de ações, aproveitando a valorização da bolsa;
- linhas de crédito oferecidas por bancos;
- bonificações em ações, que dispensam desembolso imediato de caixa.
Efeito sobre investidores e fluxo cambial
Natal avalia que a nova alíquota pode desestimular o investimento produtivo, sobretudo do investidor pessoa física, que passa a comparar o rendimento líquido de dividendos tributados com aplicações de renda fixa próximas a 15% ao ano.
Para os estrangeiros, a tendência é manter os recursos fora do país. Cálculos do Itaú BBA apontam que a antecipação de dividendos poderá provocar saída de US$ 25 bilhões a US$ 35 bilhões no último trimestre de 2025, bem acima da média anual de US$ 15 bilhões. O banco projeta o dólar a R$ 5,35 no fim de 2025 e a R$ 5,50 em 2026, cenário que pode exigir atuação do Banco Central se a volatilidade aumentar.
Possível extensão de prazo no Senado
Tramita no Senado o PL 5.473/2025, cujo relator, senador Eduardo Braga (MDB-AM), incluiu emenda que prorroga o prazo para aprovação dos dividendos de 2025 até 30 de abril de 2026. A votação foi adiada para 2 de dezembro. O resultado poderá aliviar a pressão sobre empresas que ainda ajustam suas estratégias.
A nova tributação busca compensar a redução na arrecadação do Imposto de Renda de pessoas físicas, mas executivos e advogados alertam para o possível efeito inverso: retirada de capital, reinvestimento no exterior e transferência de sedes para jurisdições consideradas mais estáveis.
Até a definição do Congresso, a corrida continua: quanto antes a assembleia deliberar, menor a fatura fiscal para acionistas.
Com informações de Gazeta do Povo