Especialistas em direito penal afirmam que a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que impôs prisão domiciliar ao ex-presidente Jair Bolsonaro na segunda-feira (4), afronta dispositivos do Código de Processo Penal (CPP) por ter sido tomada sem manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR).
De acordo com o procurador de Justiça Rodrigo Chemim, desde a reforma de 2019 o CPP determina que a decretação, substituição ou revogação de medidas cautelares só pode ocorrer por provocação do Ministério Público, do assistente de acusação ou do querelante. “O juiz não pode agir de ofício. Ao aplicar a prisão domiciliar sem requerimento da PGR, o ministro violou o texto legal”, declarou.
No caso de julho, quando Moraes impôs a Bolsonaro o uso de tornozeleira eletrônica e outras restrições, a PGR foi ouvida e apoiou as medidas solicitadas pela Polícia Federal. Dessa vez, não houve consulta prévia, o que levou juristas a apontar irregularidade.
Ausência de previsão para prisão domiciliar direta
O professor e ex-defensor público Caio Paiva sustenta que o CPP não permite decretar prisão domiciliar de forma autônoma: o recurso só pode ser adotado como substituição da prisão preventiva em situações específicas, como idade avançada, doença grave ou responsabilidades familiares excepcionais. “Nenhuma dessas hipóteses foi invocada na decisão”, disse.
Chemim acrescenta que a medida representa a conversão de uma cautelar anterior — a proibição de uso de redes sociais — em nova restrição de liberdade, sem base legal expressa. Para ele, o correto, caso houvesse pedido do Ministério Público, seria decretar prisão preventiva pelo descumprimento da cautelar e, se presentes os requisitos do artigo 318 do CPP, substituí-la por prisão domiciliar.

Imagem: Marcello Casal Jr via gazetadopovo.com.br
Críticas ao uso do artigo 312
Outro ponto questionado pelos juristas está na parte final da decisão, que prevê prisão preventiva imediata caso Bolsonaro descumpra as condições impostas. O fundamento citado foi o artigo 312, parágrafo 1º, do CPP. Para Chemim, o dispositivo não autoriza prisão domiciliar e foi empregado de forma “criativa”, servindo ao mesmo tempo para legitimar a medida e para ameaçar punição mais severa.
Além da ausência de manifestação da PGR, os especialistas classificam a prisão domiciliar do ex-presidente como abusiva, humilhante e desproporcional.
Com informações de Gazeta do Povo