A utilização de folhas, caules e amido descartados no beneficiamento da mandioca vem despontando como alternativa econômica para a nutrição de bovinos no país. Segundo o médico-veterinário Jair Siqueira, com 48 anos de experiência em nutrição animal, esses resíduos podem substituir milho e soja e reduzir significativamente as despesas de confinamentos.
A proposta foi um dos temas mais procurados na Feira Internacional da Mandioca (Fiman), realizada no fim de novembro em Paranavaí (PR), que reuniu representantes de 26 estados e 14 países.
Alto valor nutritivo nas partes aéreas
Siqueira destaca que a maior parte de proteínas, vitaminas, minerais e fibras da mandioca está nas partes aéreas, geralmente eliminadas. As folhas contêm de 20% a 28% de proteína bruta; já os caules, ou manivas, oferecem carboidratos e pectina totalmente digerível.
Para evitar intoxicação pelo ácido cianogênico da chamada mandioca brava, o especialista recomenda fenar ou desidratar o material, processo que elimina o cianeto.
Cortes sucessivos e ganhos por hectare
O cronograma sugerido prevê o primeiro corte das folhas cinco meses após o plantio. Em áreas irrigadas, podem ser realizados até oito cortes em dois anos; sem irrigação, de quatro a seis, dependendo das chuvas e do solo.
Um hectare rende entre 40 e 50 toneladas de massa verde no primeiro corte, a um custo estimado de R$ 6 mil. Vendida a R$ 500 a tonelada, a silagem gera receita de R$ 14 mil já na primeira colheita. Nos cortes seguintes, o investimento cai para cerca de R$ 1 mil, elevando a margem de lucro. Ao fim de oito cortes, o custo total projetado é de R$ 13 mil para obter 320 toneladas de forragem com teor proteico superior a 20%.
Na comparação, a mesma área plantada com milho para silagem exige novo desembolso a cada ciclo e fornece apenas 6% a 8% de proteína bruta.
Aproveitamento integral da planta
A água da lavagem do amido, conhecida como manipueira, também pode ser oferecida de forma gradual a bezerros e terneiros. Em propriedades atendidas por Siqueira, rés confinadas em piso de concreto permitem coletar urina, fezes e água de lavagem, usados posteriormente como adubo orgânico para mandioca e gramíneas.
Cenário nacional da bovinocultura e da mandiocultura
Levantamento Confina Brasil 2025, da Scot Consultoria, mostra que o milho é a base energética de 98,3% dos confinamentos visitados, seguido por sorgo (24,7%). Subprodutos de mandioca aparecem agrupados em “outros”, presentes em apenas 2,9% das fazendas.
O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) projeta que o Brasil se torne o maior produtor mundial de carne bovina em 2025. Já na mandiocultura, o país ocupa o quinto lugar global, atrás de Nigéria, Congo, Tailândia e Gana, segundo dados de 2023 da FAO.
No âmbito interno, o Pará liderou em 2024 com cerca de 4 milhões de toneladas do tubérculo, enquanto o Paraná alcançou a maior produtividade, 26,7 t/ha. Durante a Fiman, o governo paranaense anunciou R$ 1,58 bilhão em investimentos para inovação no setor, e a safra de 2025 deve chegar a 4,2 milhões de toneladas de fécula, superando as 3,7 milhões registradas em 2024.
Com a difusão das técnicas de aproveitamento dos resíduos, especialistas acreditam que o uso da mandioca na pecuária possa ganhar terreno e aliviar os custos de produção.
Com informações de Gazeta do Povo