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Decreto de Lula entrega fiscalização do ECA Digital à ANPD e provoca reação no Congresso

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Brasília – No mesmo dia em que sancionou, em 16 de novembro de 2025, o Estatuto Digital da Criança e do Adolescente (ECA Digital), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva editou um decreto que atribui a fiscalização da nova lei à Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão vinculado ao Ministério da Justiça comandado por Ricardo Lewandowski.

A decisão contraria o texto aprovado pelo Congresso, que previa a criação, por lei específica, de uma autoridade administrativa autônoma e independente do Poder Executivo para acompanhar o cumprimento das regras voltadas à proteção de menores na internet.

Medida Provisória transforma ANPD em agência reguladora

Paralelamente ao decreto, Lula editou uma Medida Provisória (MP) que converte a ANPD em agência reguladora, cria 200 cargos de especialistas em regulação de proteção de dados e mais 18 postos comissionados. A MP já está em vigor, mas precisa ser aprovada pelo Congresso em até 120 dias.

Para analisar a matéria, foi instalada uma comissão mista formada por deputados e senadores. A presidência do colegiado ficou com o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), vice-líder do governo no Congresso. Depois da eleição da mesa, em 4 de novembro, o grupo não voltou a se reunir nem marcou novas sessões.

Oposição fala em inconstitucionalidade

Integrante da comissão, o deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) afirmou que a oposição buscará reverter o ato presidencial. “Nenhum decreto pode suplantar a vontade do Congresso. Isso é inconstitucional e atenta contra a democracia”, declarou.

Van Hattem lembrou tentativa semelhante do governo no início do mandato, quando decretos alteraram pontos do Marco do Saneamento. “Ele [Lula] não respeita o Parlamento”, disse.

Autonomia era condição para aprovação do projeto

A exigência de um órgão independente foi ponto central para que o ECA Digital tramitasse durante quase três anos e fosse aprovado. Na Câmara, o relator Jadyel Alencar (Republicanos-PI) alertou, no parecer, que a autoridade de fiscalização não poderia se tornar instrumento político. No Senado, o relator Flávio Arns (Podemos-PR) defendeu a autonomia institucional “como ente de Estado e não de governo”.

ANPD assume função originalmente destinada à Anatel

O decreto também tirou da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) a tarefa de encaminhar pedidos judiciais de bloqueio a plataformas digitais, atribuição prevista no texto aprovado pelos parlamentares. Segundo o governo, haveria “vício de iniciativa” ao ampliar as competências da Anatel, argumento refutado pelo parecer de Arns no Senado.

A mudança gerou desconforto interno. Para Vivien Suruagy, presidente da Federação Nacional das Empresas de Telecomunicações (Feninfra), o Executivo aplicou um “golpe” na Anatel. “O legislador havia conferido à Anatel o papel de operacionalizar a legislação, mas, por questões ideológicas, o governo vetou esse protagonismo”, criticou.

Jurista aponta violação ao princípio da legalidade

O constitucionalista Aécio Flávio Palmeira Fernandes classifica o decreto como irregular por violar o princípio da separação dos Poderes. “Se a lei determina que a autoridade fiscalizadora deve ser criada por lei, o Executivo não pode, por ato infralegal, designar órgão já existente”, disse. Para o jurista, nem alegações de urgência ou eficiência administrativa justificam a medida.

Sem resposta do governo

Procurados, Casa Civil e Ministério da Justiça não se manifestaram até o fechamento desta reportagem.

Com informações de Gazeta do Povo