Brasília — A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou, na última quinta-feira (13), a denúncia contra o ex-assessor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Eduardo Tagliaferro, responsável por divulgar mensagens internas conhecidas como “Vaza Toga”. A decisão, unânime, transformou o servidor em réu e, segundo juristas ouvidos, pode desencorajar outros funcionários públicos a relatar irregularidades dentro do Estado.
Acusações e possíveis penas
Tagliaferro passa a responder pelos crimes de violação de sigilo funcional, coação no curso do processo, obstrução de investigação e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Somadas, as penas podem superar 20 anos de prisão.
Conteúdo dos vazamentos
As mensagens divulgadas pelo ex-assessor apontam práticas atribuídas ao ministro Alexandre de Moraes, então presidente do TSE em 2022, como monitoramento de redes sociais, investigações informais e diligências fora dos autos. Os alvos principais seriam políticos e influenciadores de direita.
“Sombra” sobre denunciantes internos
Para o professor de Processo Penal Rodrigo Chemim, da Universidade Positivo, o processo contra Tagliaferro “projeta uma sombra sobre a disposição dos servidores de agir em favor da integridade do Estado”. Já Luiz Guilherme Marinoni, docente da Universidade Federal do Paraná (UFPR), considera “absurdo” que o próprio ministro citado nas mensagens possa julgar o denunciante.
Risco de “lei do silêncio”
Chemim alerta que a medida pode instalar uma espécie de omertà — código de silêncio das máfias — no serviço público, ao desestimular colaborações internas e favorecer a continuidade de práticas ilícitas.
Outros alvos e legislação de proteção
Além de Tagliaferro, os jornalistas David Ágape e Eli Vieira, que divulgaram as informações, são alvo de petição criminal que pede investigação no STF por organização criminosa e outras infrações.
O Brasil possui a Lei 13.608/2018, que incentiva denúncias de crimes contra a administração pública e prevê recompensa de até 5% dos valores recuperados. Embora Tagliaferro não tenha usado canais formais de ouvidoria, a lei garante a qualquer cidadão o direito de relatar ilícitos por outras vias, inclusive à imprensa, lembra Chemim.
Histórico de delatores no país
Casos de grande repercussão surgiram de denúncias internas, como Pedro Collor em 1992 (Escândalo PC Farias), Roberto Jefferson em 2005 (Mensalão) e Marco Aurélio Gil de Oliveira em 1999 (Fórum Trabalhista de São Paulo). No exterior, o escândalo Watergate, nos anos 1970, só ganhou corpo após informações repassadas pelo então vice-diretor do FBI, Mark Felt.
Para especialistas, a abertura do processo contra Tagliaferro sinaliza um possível recuo na proteção a delatores internos, peça considerada fundamental para expor irregularidades em altos escalões do poder.
Com informações de Gazeta do Povo