O Brasil convive com uma situação paradoxal no setor elétrico: durante o dia há excedente de geração, mas, ao anoitecer, o sistema depende de usinas termelétricas caras para atender ao consumo. O descompasso pressiona as tarifas e aumenta a vulnerabilidade a apagões.
Excesso solar e eólico obriga desligamentos
No horário comercial, a produção de energia supera a demanda, obrigando o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) a determinar o desligamento parcial de usinas solares e eólicas para evitar sobrecarga. Em agosto de 2025, 26% da geração centralizada dessas duas fontes foi cortada — recorde histórico, segundo levantamento do Itaú BBA. Nesse mês, o corte atingiu 23% da produção eólica e 38% da solar.
O ponto mais crítico ocorreu no segundo domingo de agosto, Dia dos Pais, quando o ONS reduziu em 93% a geração desses parques próximos ao meio-dia, horário de baixo consumo industrial e comercial.
Perdas bilionárias para geradores
Entre janeiro e agosto, o “curtailment” somou 17% da produção, mais que o triplo do observado em 2024. A consultoria Volt Robotics estima que as usinas perderam R$ 6 bilhões desde outubro de 2021, dos quais R$ 3,2 bilhões apenas em 2025. Parte dos empreendedores busca na Justiça ressarcir o prejuízo.
Capacidade instalada e consumo
O Sistema Interligado Nacional (SIN) tem hoje 214 gigawatts (GW) de potência instalada, além de mais de 40 GW provenientes da micro e minigeração distribuída (MMGD). Mesmo com esse volume, o consumo médio nesta época do ano gira pouco acima de 80 GW, chegando a 100 GW nos dias mais quentes do verão.
A oferta, porém, não está totalmente disponível o tempo todo. Eólicas dependem de vento, solares de luminosidade e hidrelétricas de nível de reservatório. À noite, quando a produção fotovoltaica cai a zero, o sistema recorre às termelétricas, cujo custo adicional aparece nas “bandeiras tarifárias” da conta de luz.
Transmissão limitada e vulnerabilidade a blecautes
Grande parte da geração eólica e solar se concentra no Nordeste, região que não consome todo o excedente e precisa enviar energia ao Sudeste. A infraestrutura de transmissão não cresceu na mesma velocidade, criando gargalos. Em agosto de 2023, uma falha em linha de transmissão no Ceará e em equipamentos de usinas renováveis provocou um apagão que afetou mais de 30% do país.
Consumidor pode arcar com energia não gerada
O governo estuda alternativas para lidar com os prejuízos dos geradores. Caso haja ressarcimento, mesmo que parcial, a tendência é de repasse às tarifas. Assim, o consumidor pode pagar por energia que não foi entregue ao sistema, repetindo episódios de décadas anteriores.
Com informações de Gazeta do Povo